Economia

China avança mais na venda à vizinhança brasileira

abr, 18, 2023 Postado porSylvia Schandert

Semana202319

A China vem ganhando mais espaço no fornecimento de produtos aos países vizinhos do Brasil em relação ao período pré-pandemia. Considerando as cinco maiores economias da América do Sul após o Brasil – Argentina, Colômbia, Peru, Chile e Equador -, a China avançou na participação de fornecimento de bens para todos os mercados entre 2019 e 2022.

Os chineses forneceram no ano passado pelo menos 20% do quinhão das importações em todos os cinco países, sendo que em três deles – Peru, Chile e Equador – a fatia passa dos 25%. No mesmo grupo de países, o Brasil conseguiu aumentar o seu quinhão de mercado em três destinos desde 2019. Considerando ainda os mesmos cinco países, exceto na Argentina, onde forneceu 19,6% dos produtos importados no ano passado, o Brasil tem participação que não passa de 10%.

De 2019 para 2022 os produtos brasileiros recuaram na Argentina, onde além de perder fatia de mercado, também viram os chineses tomarem a posição histórica do Brasil de exportador líder durante a pandemia. Também houve recuo de participação no Equador, onde o Brasil é seguido de perto por outro país asiático, a Coreia do Sul.

Os Estados Unidos, também importante exportador para a região – proveem pelo menos 20% das importações em quatro dos cinco mercados -, avançaram no quinhão de participação em três países em igual período. Os americanos perderam fatia na Colômbia, destino no qual ainda lideram, mas só ficaram à frente da China em 0,1 ponto percentual de participação no ano passado. No mercado argentino a fatia dos EUA dentre as importações é praticamente a mesma da de 2019.

A China exportou para os cinco países total US$ 81,4 bilhões em 2022, seguida pelos americanos, com US$ 71,2 bilhões. O Brasil vendeu ao mesmo grupo de países total de US$ 36,3 bilhões em produtos.

Os números foram levantados pelo Valor com base em dados oficiais dos cinco países sul-americanos. Segundo a Secretaria de Comércio Exterior (Secex/Mdic), o Brasil vendeu aos cinco países total de US$ 34,1 bilhões em 2022. A diferença de dados acontece em razão do intervalo de registro de embarques e desembarques e também de certos critérios metodológicos. O Brasil, por exemplo, utiliza valor Free on Board (FOB) enquanto alguns países vizinhos, como Chile, Colômbia e Argentina, usam o Cost, Insurance and Freight (CIF). A diferença é que valores como frete e seguro não estão incluídos em valores FOB, mas integram valores CIF.

Veja abaixo um gráfico que mostra a evolução das exportações de contêineres do Brasil para Argentina, Colômbia, Peru, Chile e Equador entre janeiro de 2019 e fevereiro de 2023, de acordo com o serviço de dados DataLiner.

Exportações brasileiras de contêineres | jan 2019 – fev 2023 | TEU

Fonte: DataLiner (clique aqui para solicitar uma demonstração) 

José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), diz que os dados refletem a perda de competitividade brasileira na exportação de produtos manufaturados aos países sul-americanos. Mesmo com maior vantagem logística, pela proximidade geográfica, o Brasil não tem conseguido ganhar muito mais espaço nas importações sul-americanas do que os chineses. “Os dados mostram que a distância não é fator impeditivo para a China vender mais na região”, diz.

“Os dados mostram um quadro oposto à da tendência do nearshoring e friendshoring”, diz Rafaela Vitória, economista-chefe do Banco Inter, referindo-se a estratégias nas quais se busca parceiros comerciais mais próximos ou que possam ser considerados mais confiáveis. Para ela, o Brasil poderia avançar no comércio regional repensando parcerias estratégicas, de modo semelhante ao que os Estados Unidos têm feito em relação a México e Canadá.

Para Castro, o quadro do comércio com a vizinhança só mudará se houver redução de custo de produção para a indústria brasileira. Caso contrário, o fornecimento do setor se manterá dependente do mercado doméstico, diz. “O Brasil precisa olhar com mais cuidado a vizinhança, que ainda é o grande mercado brasileiro de manufaturados, sem o qual estaríamos exportando apenas commodities.” Para ele, os dados do Brasil nos mercados vizinhos, estariam piores se não fossem as commodities, cuja alta de preços favoreceu as exportações de forma geral no período mais recente.

Os mercados sul-americanos são grandes compradores de manufaturados como automóveis, suas partes e peças, além de tratores, equipamentos agrícolas e produtos laminados de ferro e aço, mas também passaram a absorver parcela maior de commodities brasileiras nos últimos anos.

Segundo dados da Secex, no conjunto dos mesmos cinco países sul-americanos, o petróleo bruto foi o primeiro item da pauta de exportação brasileira em 2021 e no ano passado. Em 2022, o Brasil vendeu a esses vizinhos US$ 3,76 bilhões em óleos brutos de petróleo e minerais betuminosos, cerca de US$ 500 milhões a mais do que vendeu em automóveis para passageiros. Em 2019 o quadro era outro. Os veículos estavam no topo da lista, no valor de US$ 2,91 bilhões. O petróleo vinha em segundo lugar, mas com diferença larga para os automóveis, com venda total de US$ 1,2 bilhão.

Livio Ribeiro, economista, sócio da consultoria BRCG e pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), destaca que a liderança do petróleo nos embarques brasileiros aos cinco países no ano passado também reflete a ascensão do Brasil no ranking da produção e exportação mundial da commodity.

“Hoje estamos entre os dez maiores produtores e exportadores globais de petróleo, posição que não tínhamos há dez anos. Isso pode fazer diferença não somente na balança comercial como também do ponto de vista fiscal, porque pode gerar maior arrecadação ao país”, diz Ribeiro. Ele ressalta, porém, que o Brasil não influencia preços de petróleo, o que sujeita o país ao sobe-desce de cotações da commodity, tendo efeito também na viabilidade do aumento esperado de produção. “O petróleo é um maná dos céus, mas isso não é livre de riscos e aumenta a volatilidade da receita esperada.”

Para além da questão do petróleo, diz Ribeiro, há a redução da fatia brasileira na importação de bens industriais pelos países sul americanos. O maior exemplo, diz, é a Argentina, mercado no qual, mesmo com condições mais favoráveis propiciadas pelo Mercado Comum do Sul (Mercosul), o Brasil perdeu “proeminência” para a China, que vem deslocando o Brasil no fornecimento de bens de média e alta complexidade no mundo. E isso vem acontecendo, diz, também em mercados tradicionais brasileiros para esse tipo de bem.

“A indústria brasileira de média e alta complexidade está ficando sem lugar no mundo” avalia Ribeiro. “De forma geral, a indústria brasileira não é competitiva o suficiente para lidar com grandes players, não é inovadora o suficiente para trazer mudança no mercado e tem custos elevados.”

Para Rafaela, do Banco Inter, a alta carga tributação sobre produção e mão de obra é um dos desafios para a maior competitividade da indústria de transformação. Por isso, diz, a reforma tributária, com a adoção de um Imposto sobre Valor Agregado (IVA), nos moldes do que o governo federal defende, é prioritária para o país.

Fonte: Valor Econômico

Para ler a reportagem original, acesse: https://valor.globo.com/brasil/noticia/2023/04/18/china-avanca-mais-na-venda-a-vizinhanca-brasileira-1.ghtml

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